Em tempos difíceis de diálogo entre a sociedade civil organizada, e o atual governo (especialmente aqueles ditos progressistas) nada melhor que trazer texto escrito em 1970 pelo professor Paulo Freire, patrono da Educação Brasileira, nos quais muitos integrantes do governo (especialmente o estadual e o federal) aparentemente “beberam” de sua fonte e que precisam, mais do que nunca, reler. O texto pode ser lido no livro Pedagogia do Oprimido (Editora Paz e Terra).
Uma ressalva é que o texto fala em homens, o que para nós do CEA ficaria mais interessante se expressasse além dos homens, as mulheres, ou talvez seres humanos. Apesar de que a prática não dialógica é percebida muito mais em homens de que em mulheres.
EDUCAÇÃO DIALÓGICA E DIÁLOGO
por Paulo Freire
Não há diálogo, porém, se não há um profundo amor ao mundo e aos homens. Não é possível a pronúncia do mundo, que é um ato de criação e recriação, se não há, amor que a infunda
Sendo fundamento do diálogo, o amor é, também, diálogo. Daí que seja essencialmente tarefa de sujeitos e que não possa verificar- se na relação de dominação.
Nesta, o que há é patologia de amor: sadismo em quem domina; masoquismo nos dominados. Amor, não, Porque é um ato de coragem, nunca de medo, o amor é compromisso com os homens. Onde quer que estejam estes, oprimidos, o ato de amor está em comprometer-se com sua causa. A causa de sua libertação. Mas, este compromisso, porque é amoroso, é dialógico.
Como ato de valentia, não pode ser piegas; como ato de liberdade, não pode ser pretexto para a manipulação, senão gerador de outros atos de liberdade. A não ser assim, não é amor.
Somente com a supressão da situação opressora é possível restaurar o amor que nela estava proibido.
Se não amo o mundo, se não amo a vida, se não amo os homens, não me é possível o diálogo.
Não há, por outro lado, diálogo, se não há humildade. A pronúncia do mundo, com que os homens o recriam permanentemente, não pode ser um ato arrogante.
O diálogo, como encontro dos homens para a tarefa comum de saber agir, se rompe, se seus pólos (ou um deles) perdem a humildade.
Como posso dialogar, se alieno a ignorância, isto é, se a vejo sempre no outro, nunca em mim?
Como posso dialogar, se me admito corno um homem diferente, virtuoso por herança, diante dos outros, meros “isto”, em quem não reconheço outros eu?
Como posso dialogar, se me sinto participante de um “gueto” de homens puros, donos da verdade e do saber, para quem todos os que estão fora são “essa gente”, ou são “nativos inferiores”?
Como posso dialogar, se parto de que a pronúncia do mundo é tarefa de homens seletos e que a presença das massas na história é sinal de sua deterioração que devo evitar?
Como posso dialogar, se me fecho à contribuição dos outros, que jamais reconheço, e até me sinto ofendido com ela?
Como posso dialogar se temo a superação e se, só em pensar nela, sofro e definho?
A auto- suficiência é incompatível com o diálogo. Os homens que não têm humildade ou a perdem, não podem aproximar- se do povo. Não podem ser seus companheiros de pronúncia do mundo. Se alguém não é capaz de sentir-se e saber- se tão homem quanto os outros, é que lhe falta ainda muito que caminhar, para chegar ao lugar de encontro com eles. Neste lugar de encontro, não há ignorantes absolutos, nem sábios absolutos: há homens que, em comunhão, buscam saber mais. Continue lendo »
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